DA INTIMIDADE AO NADA

Andréia Muito Ansiosa conheceu Henrique Tão Tímido numa festa, uma destas baladas que acontecem por aí. Fazia tempo que seus namoros não tinham uma evolução satisfatória e ela já estava cansada de tanto sofrer. Ao perceber que estava sendo correspondida nos primeiros movimentos da paquera, Andréia Muito Ansiosa se empolgou. Henrique Tão Tímido há muito também buscava um relacionamento que durasse mais de três meses e ficou encantado com Andréia. Conversaram, trocaram idéias e finalmente “ficaram” envolvidos por uma forte atração física, emocional, cultural, intelectual e tal e tal. Um mês depois, estavam sem trocar um simples “scrapp” no Orkut e o pior de tudo: nenhum dos dois sabia dizer o que havia acontecido.
Evoluímos na velocidade da comunicação, mas estamos pulando etapas que são essenciais para a evolução no conteúdo dela. Estas etapas implicam na percepção do interlocutor, na escuta apurada da linguagem que não é só a verbal e ainda, implica na coragem para se adentrar em relacionamentos duradouros.
Estamos na era dos relacionamentos descartáveis? Eliminamos o contato com as pessoas quando elas não mais nos interessam ou não mais nos convém? Passamos a temer os envolvimentos mais profundos?
Há algum tempo, não tão remoto, as pessoas se falavam frente a frente, olhando nos olhos. A autenticidade tinha mais chances de ser treinada e os vínculos relacionais tinham mais chances de sobreviver por toda uma vida. Porém, construir relacionamentos requer permissão interna para expressar sentimentos e idéias.
Quando expressamos nossos sentimentos, entramos em intimidade emocional com o outro. Intimidade, portanto, é a base da amizade e do amor; nem sempre está ligada ao sexo. Seres humanos possuidores de uma dimensão relacional desenvolvida, dotados de abundante capacidade de entrar em intimidade com as pessoas, não se limitam em seus relacionamentos. Querem compartilhar momentos de afeto, idéias e cultura de ser humano para ser humano. Querem trocar “figurinhas” constantemente, são ávidos por envolvimentos interpessoais, sentem prazer em tudo que está relacionado ao contato qualitativo com as pessoas.
A situação dos bancos de Wall Street e a queda do mercado acionário nos últimos dias colocam em risco a economia mundial expondo milhões de pessoas ao sofrimento econômico. Paradoxalmente, evitar sofrimento é o principal motivo pelo qual as pessoas não se arriscam em relacionamentos mais profundos, deixando de vivenciar experiências gratificantes e marcantes, que ninguém poderá tirar de quem as vivencia.
Os relacionamentos estarão muito longe dos riscos, quando você investe neles seu tempo e seus sentimentos. Com calma ele vai se solidificando e se fortalecendo a cada olhar, a cada sorriso, a cada abraço.

Kátia Ricardi de Abreu, Psicóloga clínica e organizacional, graduada pela PUCCAMP, consultora de empresas, palestrante e escritora